Relatos de Experiência

Arteterapia e Psicologia: Inovando no atendimento on-line em tempos da Covid-19

Problema/Situação:

Continuar dando assistência aos pacientes do CAPS com arteterapia e psicologia diante do distanciamento social, causado pela pandemia, conforme protocolos existentes, mas sempre com o intuito de manter vínculo com os pacientes. A modalidade online, sincrônica e se preciso não sincrônico com a inserção de prática de ambas as áreas.


Texto completo:

PROJETO: ARTEIRAS ON-LINE

À Dona Cida em memória* falecida por Covid-19.

Trabalhamos no CAPS Centro de Atendimento Psicossocial I - CAPS I de Macatuba, interior de São Paulo, há 20 anos, com grupos e, este que iremos ressaltar, já era realizado com finalidade psicoterapêutica e atividades expressivas presencial, (Psicóloga Adriana Mendes e Psicopedagoga Cláudia Masseran), todas às terças-feiras, presencial com grupo de senhoras de idade de 40 a 86 anos, e tinha um vínculo fortalecido entre elas e nós, as técnicas. Como quase todas possuem celular, tínhamos um grupo no WhatsApp para mensagens aleatórias e informativas. Era um grupo composto por 12 mulheres e com diagnósticos variados, desde depressão, pânico, ansiedade, fobia, entre outros.
As oficinas realizadas já na modalidade on-line, geraram segundo relatos de sensações de bem estar como por exemplo quando direcionamos para as situações domésticas como observar as plantas, induziu lembranças do passado resgatando emoções da infância. O preparo do café da manhã, foi possível ressignificar como é importante você criar um ambiente especial, como colocar uma xícara diferente, uma toalha de mesa especial, saborear um pãozinho que antes na correria do dia a dia era tudo mais automático.
Ao ser decretada a Pandemia da Covid-19 e, com ela, novas reformulações foram necessárias a vida diária devido a contaminação desse novo vírus em meio a população, em virtude as normas emergências a serem tomadas como o distanciamento social, ocorreu uma grande preocupação em nossos atendimentos de grupo no CAPS I de Macatuba que eram presenciais. Onde vieram os primeiros questionamentos como: E agora como ficarão os atendimentos em grupo? Como as pacientes ficarão longe do CAPS?
Quando foi para nosso desafio profissional a chegada da Pandemia com o Covid-19, que recebemos a notícia que iríamos ter que dispensar os grupos em geral e seguir as regras da vigilância sanitária, novas ideias surgiram.
Como tínhamos o contato pelo grupo no whatsApp, começamos a conversar com elas orientando através de mensagens e ligações para informar sobre a necessidade de pararmos com os grupos.
Então começamos a nos questionar, e agora? O que podemos fazer pelos pacientes? Pelos nossos grupos? Como elas serão assistidas? Poderão ter recaídas em relação aos sintomas? Precisamos fazer algo para não deixá-las desassistidas. E assim seguimos as regras e normas exigidas pelos protocolos da COVID-19.
Como a Claudia Masseran era recém formada em Arteterapia, questionamos: será que podemos oferecer oficinas expressivas pelo celular? Foi quando solicitamos a Supervisão da Arteterapeuta Cássia Rando que prontamente nos orientou voluntariamente (e até hoje está conosco).
Iniciamos com oficinas expressivas - que são atividades com materiais artísticos - com finalidade terapêutica e intervenções psicológicas, diante dos desafios que cada participante apresentava e nos trazia no momento.

Já na primeira semana, gravamos um vídeo também informando que iríamos enviar mensagens diárias como por exemplo, a primeira atividade já no dia 07 de abril, 2020, pelo whatsapp, onde foi perguntado para as pacientes como elas se sentiam diante dos dias em que tudo mudou devido à pandemia em que estávamos vivendo. No bate papo positivo, foi abordado vários assuntos, entre eles, que iríamos enviar materiais que tínhamos no CAPS I no qual elas gostavam de manusear como por exemplo: linhas, barbantes, tintas, guardanapos, entre outros materiais onde elas enviavam mensagens solicitando que precisavam de algo mais, lembrando que solicitaram receita médica e também para agendamento médico ou conversa pelo celular através de ligação com a psicóloga. Diante dessa proposta a aceitação foi unânime no grupo, onde as mesmas se demonstraram motivadas, entusiasmadas e empolgadissimas.
No dia seguinte foi solicitado que realizassem o registro por meio de fotos do seu café da manhã e relatar a experiência de quais sentimentos e emoções despertaram naquele momento. E assim foram dias enviando mensagens de propostas para se sentirem amparadas e o retorno era total e positivo onde descreviam ou enviavam mensagens de voz postando suas fotos nos grupos das atividades propostas diárias.
Como estava sendo diário esse contato, elas pediam que enviássemos mensagens aos finais de semana e até no feriado, por exemplo: “hoje vocês não enviaram tarefinhas...”
Até que chegamos a uma conclusão de que as tarefinhas seriam enviadas somente durante a semana.
As tarefinhas eram planejadas e sempre com orientações sobre o Coronavírus, e a necessidade de ficarem em suas casas, o distanciamento e os novos hábitos de higiene para se protegerem, além do uso de máscaras.
Até que Adriana teve a ideia do Kit-Art que solicitamos à Prefeitura e com total apoio recebemos todos os materiais e a motorista entregou todos os kits nas residências seguindo as restrições da vigilância, e a partir desse momento, inovamos as oficinas expressivas.
Elas relataram que já se preparavam desde a manhã das terças-feiras, colocando o celular para carregar, almoçando e se arrumando para o encontro online.
Ao decorrer do tempo as atividades eram enviadas por nós e realizadas com toda dedicação por essas mulheres, fomos incluindo vídeo chamadas semanais, onde os encontros ocorriam todas as terças -feiras, sendo que todas ficavam esperando pontualmente no horário marcado às 14h, sendo que cada uma se preparava de uma forma especial para nos receber com total empolgação.
Foi muito interessante, pois num dia anterior às atividades, era possível observar as expectativas das pacientes para realizar ou até mesmo preparar os materiais para apresentarem. Logo após também foi possível acolher no grupo outros pacientes que participavam da oficina de música, onde a assistente social também auxiliava. E cabe ressaltar outros participantes que foram encaminhados para o grupo pela equipe técnica. Foi então que o grupo se tornou misto, denominado também de Arteiros On-line.
Teve uma paciente que foi para a cidade vizinha numa terça feira, e mesmo assim participou da estrada até chegar na cidade, outra estava aguardando uma consulta médica, fez questão de entrar com o celular ligado para o médico cardiologista ver o nosso grupo.
Tivemos a solicitação de uma estudante em Arteterapia para dar oficinas on-line como estágio, onde a mesma teve a oportunidade e foi muito acolhida pelas participantes.
Conseguimos também apoio da Prefeitura que nos forneceu os Kits Artes, Tablets para que nós realizássemos as vídeo-chamadas, além de camisetas personalizadas com o slogan das Arteiras e Arteiros on-line. Sendo importante destacar que o empenho foi recíproco, conseguindo manter o vínculo como grupo presencial. E tudo foi acordado que permaneceria o atendimento de forma on-line até que outras mudanças ocorressem nos protocolos da COVID-19.
Dentre todos os participantes cabe aqui relatar sobre nossa querida d Cida que teve uma participação intensa com sua alegria contagiante durante os encontros, apoiando, incentivando e aconselhando as demais participantes com muito amor expresso seja verbalizando ou em registro através de palavras nas atividades propostas. (anexo)

À nossa querida Dona Cida
que nas terças feiras nos trouxe a esperança,
com suas altas risadas e com o sorriso de uma eterna criança,
trazia na lembrança a saudade de sua infância
e em alguns encontros rolaram as lágrimas das dores do desencontro.


Objetivos/Resultado esperados:

Manter vínculos com as pacientes que estavam em casa, por causa do distanciamento social, algumas já idosas e entre elas uma que morava sozinha. Continuar com o trabalho que já era realizado presencialmente e substituí-los por atendimentos on-line.
Prover alívio de sintomas, com os atendimentos direcionados, como doenças traumáticas e dificuldades em lidar com sentimentos de medo e solidão, dentre outros, anterior e também referentes ao distanciamento da pandemia.
Utilizamos como ferramentas os atendimentos online para darmos continuidade aos tratamentos anteriores, através de oficinas expressivas e intervenções psicológicas para evitar que os pacientes se desestabilizassem diante dos quadros de ansiedade, depressão, pânico, entre outros, pois já estavam sendo amparados presencialmente pelas atividades desenvolvidas antes do contexto de pandemia, além da preocupação com os agravos devido ao cenário da pandemia.
Estimular o contato social não presencial devido o distanciamento, oferecendo também assim um suporte direcionados a sentimentos como solidão, e os problemas associados à depressão e outros transtornos mentais. Motivando os afazeres domésticos pois eles trazem a sensação de bem estar, autonomia. Por exemplo, ao preparar o café da manhã, ao tirar fotos de plantas, da natureza, se preparar com a roupa preferida para as reuniões online, enviar fotos e compartilhar a história da vestimenta, de quem ganhou, produzem vínculo, pertencimento, vida em comunidade. Muitas vezes, as pessoas não se atentam e não sabem desses valores do dia a dia, mas é uma estratégia poderosa para empoderamento e autocuidado.
Continuar o trabalho do estímulo de habilidades manuais através de recursos artísticos, despertando assim o potencial criativo, dando forma, cor e expressão aos sentimentos inominados, fazendo conexões e atribuindo novos significados a velhas situações vividas que não puderam ter livre canal de expressão nos momentos em que ocorreram, ou seja, expressar os conflitos internos e assim favorecendo o não adoecer diante da pandemia.
Proporcionar redescoberta da independência e capacidade das habilidades, por exemplo, ao preparar um presente surpresa com recicláveis que tinham nas suas casas para a aniversariante do mês, ao escrever uma carta, ao fazer uma lembrança de natal para todas.
Facilitar ao indivíduo uma atitude mais autêntica em relação a si próprio (autocompreensão responder melhor às situações).
Clarificar como agir no futuro em novas direções (facilitar a abertura a novas possibilidades, poder de autocriação, uso de capacidades e habilidades próprias).


Recursos:

Começamos com o que tínhamos e então fomos descobrindo mais recursos e desenvolvendo o trabalho:
- Smartphones; vídeos informativos e motivacionais - pesquisamos referente aos temas trabalhados.
- Kit artes: lápis, lápis de cor, borracha, apontador, caderno, caneta, tintas, pincéis, revistas, gravuras, cola, tesoura sem ponta, entre outros - Contação de histórias através de livros como "O Vaso Rachado", "Contos que curam", dentre outros.
- Recursos humanos - tivemos ajuda do José Ardonio. Ele é Mestrando em comunicação pela Universidade Estadual Paulista - Unesp e Jornalista, que nos deu suporte no desenvolvimento dos vídeos, além de materiais tecnológicos, entre eles o whatsapp para reuniões e videoconferência.


Resultados alcançados/Impactos:

Dentre algumas perdas, as atividades propostas foram favoráveis aos resultados que esperávamos.
Ex. Tivemos a perda de uma delas, que faleceu de COVID. Sua morte mexeu com o emocional do grupo, onde foi necessário intervir no planejamento direcionando uma técnica específica para o luto coletivo. A irmã que foi internada também pelo COVID, pediu para entrar no lugar da irmã. Ela passou pelo processo do CAPS, como a consulta com psiquiatra e ela ainda faz parte do grupo. E daí ela foi incluída no grupo de luto, que veio depois da pandemia, pós covid e se mantém até hoje. Depois da pandemia, se organizaram para atividades presenciais juntas.
Reconstrução das vidas em tempos difíceis como isolamento social, medos e perdas diante de uma pandemia.
Impacto nos trabalhadores que se juntaram à nós, no trabalho online, com suas especializações e com isso, auto valorização e empoderamento.
Houve impacto nos familiares, fortalecendo os vínculos familiares. A filha de uma das pacientes, por exemplo, mesmo trabalhando fora, dava suporte auxiliando a mãe analfabeta, orientando e informando horário, dia das atividades propostas, além de ler para a mãe as mensagens enviadas no grupo do whatsapp dando apoio necessário para o bem estar de sua mãe.
Pudemos constatar, através dos relatos durante o trabalho na pandemia, que melhorando a mente da gente, os pensamentos vão melhorando, e assim os comportamentos também se tornam saudáveis. Após pandemia, as pacientes voltaram à assistência no formato presencial sem sequelas da pandemia.

Houve também resultados inesperados:
O vínculo das pacientes com as outras e conosco e a permanência do vínculo. O envolvimento tão forte, o compromisso delas com as oficinas online, como participarem da oficina durante a viagem para o médico ou na espera da consulta do cardiologista e apresentar a oficina ao cardiologista e se arrumarem, até fazerem escovas de cabelo, para participarem das oficinas online.
Além do vínculo que as pacientes estabeleceram uma com a outra, houve também o fortalecimento de vínculo da paciente com seus familiares. Uma das pacientes, por exemplo, participava das oficinas juntamente com a neta do lado, onde postava fotos no grupo. Com isso o vínculo de vó e neta foi fortalecido
As oficinas de arteterapia online se tornaram oficiais, e de acordo com as necessidades diagnosticadas pelo médico psiquiatra, assistente social, enfermeiro, terapeuta ocupacional e psicóloga, outros pacientes foram encaminhados para os projetos "Arteiros e Arteiras Online". Os novos pacientes se sentiram bem acolhidos e se vincularam ao grupo. Uma participante da cidade vizinha, por exemplo, que estava num momento difícil, também foi incluída no grupo de online falou sobre a importância do acolhimento para o grupo na melhora de sua saúde.
A presença era de todas e quando não podiam participar davam um jeitinho de estar no momento da chamada a ponto de ter pacientes que faziam parte da oficina enquanto viajavam para ir ao médico e outra no cardiologista, que fez questão de entrar com o aparelho ligado e mostrar ao cardiologista a oficina em funcionamento e o valor da mesma. A solução das dificuldades como a construção de suporte de celular artesanal que foi feito para todas e entregue pela prefeitura.
A expansão do projeto online para outros grupos como o de oficina de música, com participantes de ambos os sexos, que já era realizada neste CAPS I, de forma presencial. Com a percepção das profissionais de referência, no caso a Arteterapeuta e a Assistente Social, sobre as necessidades de seus atendidos, foi dada a continuidade a essas oficinas surgindo assim os Arteiros Online, realizados semanalmente.
O apoio da prefeitura de forma tão pronta.
Autocuidado e cuidado com o outro - fortalecimento da saúde do indivíduo e da comunidade.
Algumas falas das pacientes relatam esses resultados:
"Vai melhorando a mente da gente, os pensamentos vão melhorando"
"As arteiras pra mim foi um benefício muito grande, pela quarentena que estamos passando, e gosto de fazer no caderninho que está quase cheio, pode trazer mais pra mim"
"E a hora que eu estava procurando a figura estava com mal estar desde cedo( só na cama), depois na hora comecei a colar,e no último que colei, vi que dava pra ficar em pé, porque realmente não tá fácil ficar em casa. Tenho dó das crianças , das crianças em geral, a gente lembra das netas, tomara que tudo isso se resolva. Esse vazio faz a gente pensar nas coisas porque faz a gente pensar na vida… é vazio mas neste vazio vem um monte de coisa ...ah se não fosse esse grupo!"
"Usufruindo com nova tecnologia arranjando novas maneiras de se conectar, igual as abelhas tudo junto por causa do coronavírus. O Sol vai voltar depois do coronavírus.O sol precisa brilhar dentro da gente! A esperança é um dom que todos nós temos dentro de nós mesmos."
"A gente não vê a hora que chega a terça feira, para falar com vocês, esses três meses que estamos vivendo, as tarefas ajudam alivia principalmente quando é para pintar, transporta para o passo da infância, de vez em quando peço ajuda, senão faço direto, me preparo antes, almoço só para esperar vocês chamar no celular."


Desafios:

O primeiro desafio foi como começar a fazer arteterapia e psicologia online com essas pacientes no contexto em que se encontravam. Contamos com a supervisão da Arteterapeuta e artista plástica, Cássia Rando, quando surgiu o principal questionamento: vamos fazer oficinas de arteterapia on-line? É possível? As nossas experiências com “oficinas expressivas” sempre foram presenciais.
Começamos a enviar mensagens de atividades motivadoras que pudessem realizar com o que tinham em suas residências, itens básicos e que as mesmas se sentissem à vontade para criar, de acordo com as tarefas por nós demandas e ainda, de acordo com o tempo de cada uma.
Enviamos através de mensagens pelo whatsapp as oficinas expressivas que criamos, pensando nos recursos e materiais que todas pudessem ter em comum em suas casas. Com o objetivo de valorizar os momentos de contato com a natureza mesmo que só, exploramos o sentido do interagir com as plantas, observando os formatos, e as espécies, sentindo o perfume que exalam das flores, entrando em contato com as cores das flores e das folhas em suas diferentes tonalidades. Através dessas oficinas começamos a perceber que foi possível resgatar a ação de tornar mais prazerosa as atividades cotidianas. O preparar a mesa do café da manhã, enfatizando o fluir das atitudes que estavam adormecidas, por exemplo, ao utilizar xícaras, talheres, garrafas térmicas, bolachas e o pãozinho fresco motivaram as participantes, conforme relataram que já não preparavam o café da manhã mais, ao ponto de tirarem foto e enviem para o grupo. Essa partilha disparou verbalização através de comentários e elogios sobre as fotos, e consequentemente o vínculo. Ao usarem os utensílios de cozinha, por exemplo, traziam nas memórias, lembranças da infância, dos seus filhos que era despertado naquele momento, sentimentos negativos, positivos, distorções que vinham à tona. Nós fazíamos o trabalho de direcionar para uma forma construtiva. Mas o interessante é que nasceu o apoio mútuo, cada uma apoiando uma à outra. Desta forma, o isolamento social se restringiu ao presencial e novas formas de interação social foram se estabelecendo, e com ela, a diminuição de sintomas relacionados à solidão, principalmente nesta população.
E assim, durante o fazer fomos descobrindo o que poderia ser feito, como atividades expressivas, até chegamos nas oficinas de arteterapia usando materiais, descobrindo o formato online em grupo, além do individual, como também as modalidades síncrona, assíncrona, e desenvolvimento de intervenções em grupo.
Outra dificuldade que surgiram destacamos o planejamento. As pacientes começaram a pedir atividades no sábado e domingo e até mesmo nos feriados. Foi quando percebemos que precisávamos nos organizar para encontros semanais em grupo. Decidimos então que os encontros seriam por WhatsApp com vídeo chamadas. Não foi possível realizar em outros formatos, embora feitas várias tentativas, como zoom, google forms meet.
Como as oficinas estavam tendo muitos resultados positivos como solidariedade, autocuidado e superação de sintomas relacionados ao isolamento social, vimos a necessidade de implementar novos materiais nas oficinas. Como algumas pacientes não tinham condições de comprar o material, solicitamos à prefeitura, que prontamente providenciou caixas organizadoras com tampa e materiais com finalidade arteterapêuticas, e posteriormente entregou a cada uma das pacientes, em suas casas, inclusive a camiseta, quando surgiu o projeto "Arteiras e Arteiros Online", com o slogan e adesivo para ser colado na tampa da caixa, que por sua vez, foi desenhado por Cássia Rando.
Outro desafio era entender as necessidades das pacientes para então propor atividades que pudessem preencher as lacunas existentes.
A tecnologia foi outro grande desafio, pois o whatsapp só permite quatro pessoas por videoconferência. Tentamos usar outros meios de mídia, como zoom, mas as pacientes tinham muita dificuldade em usá-las fazendo o uso de outras mídias impossível.
Outro desafio era a dúvida sobre o cumprimento das atividades terapêuticas propostas nas oficinas de vídeo que fazíamos e enviávamos. Será que vão conseguir as tarefas das oficinas de arteterapia? Será que vão deixar para amanhã ou depois a realização das atividades propostas? Essas perguntas eram presença constante.
Começar a usar algo, como whatsapp, por outro motivo; falar com várias pessoas ao mesmo tempo para nós; e ter as usuárias com dificuldade de usar a internet, precisando de ajuda dos familiares. Alguns ajudaram, outros não, o que desmotiva muito as pacientes. Uma, por exemplo, amava participar do grupo e tinha muita habilidade em bordar, mas a filha dela não colaborou e ela não pôde participar.
Algumas atividades ajudaram promover solidariedade, o cuidado com o outro como também o autocuidado:
Uso da música, comemoração de aniversário, bolo, balões, dentre outros.. Mensagens no particular, uma oficina de arte terapêutica em grupo, instigando cada uma do grupo a fazer um trabalho manual para a aniversariante com o que tinha em casa. Daí a prefeitura mandou pegar as lembrancinhas e, depois de higienizá-las, levou para a aniversariante os presentes de todas. Esse acolhimento entre elas foi positivo. Cada um fazendo do seu jeito - cartas, foto…
Troca de fotos de plantas e de atividades que faziam, uma ajudando a outra, trocando com a outra. Troca de histórias também, músicas e uma sensação positiva de recordações e reflexões.
Houve pacientes que “travaram” e não conseguiram falar. As outras observaram e ficaram preocupadas.

Para os momentos desafiadores da solidão na pandemia, desenvolvemos e usamos atividades dirigidas como uma atividade/metáfora usando a teia, em que uma estava ligada à outra simbolicamente, dando ideia de união.
Como parte da vivência identificamos um trauma de infância em duas pacientes. Trabalhamos através da psicoterapia, de forma individual. A mesma se manteve no grupo, mas com atendimento individual.
Sobre tolerância, aplicamos uma vivência direcionada, pois uma das das pacientes relatou a dificuldade de tolerar outra que falava muito, e assim, com o tempo, se ajustaram.



Lições aprendidas:

Observamos que apesar do distanciamento físico, foi possível manter os vínculos afetivos entre os participantes e a equipe técnica da Instituição através das oficinas "arteiras online".
Os participantes apresentaram entusiasmo e motivação diante das oficinas demonstrando criatividade primeiro na utilização dos recursos conforme o que cada um tinha em casa; depois, com os kits enviados para suas residências, para a realização das oficinas propostas, estimulando o contato social não presencial.
O compartilhar dos sentimentos de solidão e as vivências do cotidiano ajudaram os participantes no alívio das tensões, em virtude do distanciamento social, e nas questões pessoais. Tivemos relatos, de uma forma geral, sobre a necessidade de manter oficinas até mesmo nos finais de semana e feriados.
Observamos, igualmente, que foi possível estimular o sentimento contido e externar emoções que atuavam como um bloqueio na vida pessoal e que carinhosamente o grupo acolheu oferecendo recursos e exemplos de superação.
De acordo com os recursos arteterapêuticos foi possível promover nos participantes o autoconhecimento e a interação com o seu interior tornando seus conteúdos conscientes na medida em que foram expressos quando lhes deram uma forma, mesmo que ainda resquícios permaneçam no inconsciente. Acontece no homem um movimento dinâmico de sobrevivência transformando a realidade visível em arte subjetiva e assim, ocorrendo a percepção de si mesmo.
O Projeto "Arteiras e Arteiros On-line" mobilizou os pacientes do CAPS I que estavam em terapias presenciais antes da pandemia, de uma maneira muito satisfatória, pois sentiam a necessidade de manter o vínculo afetivo com os colegas.
De Grupo e com as terapeutas, visto que, por meio da comunicação expressão-criativa de cada um deles, a Arteterapia e a Psicoterapia contribuíram para a construção afetiva, tornando-os mais resilientes para o enfrentamento diário diante da pandemia que estamos vivendo. Como já visto, as oficinas foram realizadas por meio da materialização das linguagens da arte e de seus recursos expressivos, possibilitando o ajuste emocional e comportamental dos pacientes envolvidos no projeto. Este caminho de transformação está sendo vivenciado de tal forma que até as dificuldades serviram de aprendizado. Por meio dos recursos arteterapêuticos, os pacientes têm conseguido demonstrar em seus relatos a satisfação e a alegria de descobrirem capacidades e habilidades diante das atividades executadas.
Nesse cenário, podemos afirmar que é possível desenvolver intervenções arteterapêuticas na modalidade on-line.
A importância do ouvir, de não parar mesmo com a pandemia, mas de fazer algo para salvar as vidas.


Acesse o relato em texto completo:

Texto completo

PROJETO: ARTEIRAS ON-LINE

À Dona Cida em memória* falecida por Covid-19.

Trabalhamos no CAPS Centro de Atendimento Psicossocial I - CAPS I de Macatuba, interior de São Paulo, há 20 anos, com grupos e, este que iremos ressaltar, já era realizado com finalidade psicoterapêutica e atividades expressivas presencial, (Psicóloga Adriana Mendes e Psicopedagoga Cláudia Masseran), todas às terças-feiras, presencial com grupo de senhoras de idade de 40 a 86 anos, e tinha um vínculo fortalecido entre elas e nós, as técnicas. Como quase todas possuem celular, tínhamos um grupo no WhatsApp para mensagens aleatórias e informativas. Era um grupo composto por 12 mulheres e com diagnósticos variados, desde depressão, pânico, ansiedade, fobia, entre outros.
As oficinas realizadas já na modalidade on-line, geraram segundo relatos de sensações de bem estar como por exemplo quando direcionamos para as situações domésticas como observar as plantas, induziu lembranças do passado resgatando emoções da infância. O preparo do café da manhã, foi possível ressignificar como é importante você criar um ambiente especial, como colocar uma xícara diferente, uma toalha de mesa especial, saborear um pãozinho que antes na correria do dia a dia era tudo mais automático.
Ao ser decretada a Pandemia da Covid-19 e, com ela, novas reformulações foram necessárias a vida diária devido a contaminação desse novo vírus em meio a população, em virtude as normas emergências a serem tomadas como o distanciamento social, ocorreu uma grande preocupação em nossos atendimentos de grupo no CAPS I de Macatuba que eram presenciais. Onde vieram os primeiros questionamentos como: E agora como ficarão os atendimentos em grupo? Como as pacientes ficarão longe do CAPS?
Quando foi para nosso desafio profissional a chegada da Pandemia com o Covid-19, que recebemos a notícia que iríamos ter que dispensar os grupos em geral e seguir as regras da vigilância sanitária, novas ideias surgiram.
Como tínhamos o contato pelo grupo no whatsApp, começamos a conversar com elas orientando através de mensagens e ligações para informar sobre a necessidade de pararmos com os grupos.
Então começamos a nos questionar, e agora? O que podemos fazer pelos pacientes? Pelos nossos grupos? Como elas serão assistidas? Poderão ter recaídas em relação aos sintomas? Precisamos fazer algo para não deixá-las desassistidas. E assim seguimos as regras e normas exigidas pelos protocolos da COVID-19.
Como a Claudia Masseran era recém formada em Arteterapia, questionamos: será que podemos oferecer oficinas expressivas pelo celular? Foi quando solicitamos a Supervisão da Arteterapeuta Cássia Rando que prontamente nos orientou voluntariamente (e até hoje está conosco).
Iniciamos com oficinas expressivas - que são atividades com materiais artísticos - com finalidade terapêutica e intervenções psicológicas, diante dos desafios que cada participante apresentava e nos trazia no momento.

Já na primeira semana, gravamos um vídeo também informando que iríamos enviar mensagens diárias como por exemplo, a primeira atividade já no dia 07 de abril, 2020, pelo whatsapp, onde foi perguntado para as pacientes como elas se sentiam diante dos dias em que tudo mudou devido à pandemia em que estávamos vivendo. No bate papo positivo, foi abordado vários assuntos, entre eles, que iríamos enviar materiais que tínhamos no CAPS I no qual elas gostavam de manusear como por exemplo: linhas, barbantes, tintas, guardanapos, entre outros materiais onde elas enviavam mensagens solicitando que precisavam de algo mais, lembrando que solicitaram receita médica e também para agendamento médico ou conversa pelo celular através de ligação com a psicóloga. Diante dessa proposta a aceitação foi unânime no grupo, onde as mesmas se demonstraram motivadas, entusiasmadas e empolgadissimas.
No dia seguinte foi solicitado que realizassem o registro por meio de fotos do seu café da manhã e relatar a experiência de quais sentimentos e emoções despertaram naquele momento. E assim foram dias enviando mensagens de propostas para se sentirem amparadas e o retorno era total e positivo onde descreviam ou enviavam mensagens de voz postando suas fotos nos grupos das atividades propostas diárias.
Como estava sendo diário esse contato, elas pediam que enviássemos mensagens aos finais de semana e até no feriado, por exemplo: “hoje vocês não enviaram tarefinhas...”
Até que chegamos a uma conclusão de que as tarefinhas seriam enviadas somente durante a semana.
As tarefinhas eram planejadas e sempre com orientações sobre o Coronavírus, e a necessidade de ficarem em suas casas, o distanciamento e os novos hábitos de higiene para se protegerem, além do uso de máscaras.
Até que Adriana teve a ideia do Kit-Art que solicitamos à Prefeitura e com total apoio recebemos todos os materiais e a motorista entregou todos os kits nas residências seguindo as restrições da vigilância, e a partir desse momento, inovamos as oficinas expressivas.
Elas relataram que já se preparavam desde a manhã das terças-feiras, colocando o celular para carregar, almoçando e se arrumando para o encontro online.
Ao decorrer do tempo as atividades eram enviadas por nós e realizadas com toda dedicação por essas mulheres, fomos incluindo vídeo chamadas semanais, onde os encontros ocorriam todas as terças -feiras, sendo que todas ficavam esperando pontualmente no horário marcado às 14h, sendo que cada uma se preparava de uma forma especial para nos receber com total empolgação.
Foi muito interessante, pois num dia anterior às atividades, era possível observar as expectativas das pacientes para realizar ou até mesmo preparar os materiais para apresentarem. Logo após também foi possível acolher no grupo outros pacientes que participavam da oficina de música, onde a assistente social também auxiliava. E cabe ressaltar outros participantes que foram encaminhados para o grupo pela equipe técnica. Foi então que o grupo se tornou misto, denominado também de Arteiros On-line.
Teve uma paciente que foi para a cidade vizinha numa terça feira, e mesmo assim participou da estrada até chegar na cidade, outra estava aguardando uma consulta médica, fez questão de entrar com o celular ligado para o médico cardiologista ver o nosso grupo.
Tivemos a solicitação de uma estudante em Arteterapia para dar oficinas on-line como estágio, onde a mesma teve a oportunidade e foi muito acolhida pelas participantes.
Conseguimos também apoio da Prefeitura que nos forneceu os Kits Artes, Tablets para que nós realizássemos as vídeo-chamadas, além de camisetas personalizadas com o slogan das Arteiras e Arteiros on-line. Sendo importante destacar que o empenho foi recíproco, conseguindo manter o vínculo como grupo presencial. E tudo foi acordado que permaneceria o atendimento de forma on-line até que outras mudanças ocorressem nos protocolos da COVID-19.
Dentre todos os participantes cabe aqui relatar sobre nossa querida d Cida que teve uma participação intensa com sua alegria contagiante durante os encontros, apoiando, incentivando e aconselhando as demais participantes com muito amor expresso seja verbalizando ou em registro através de palavras nas atividades propostas. (anexo)

À nossa querida Dona Cida
que nas terças feiras nos trouxe a esperança,
com suas altas risadas e com o sorriso de uma eterna criança,
trazia na lembrança a saudade de sua infância
e em alguns encontros rolaram as lágrimas das dores do desencontro.

Vídeos

Imagens

Equipe


Responsável:
Adriana Maria Mendes

Filiação
CAPS I MACATUBA/SP
Cargo
Psicóloga Terapeuta Cognitivo Comportamental
E-mail
adrianamendes2008@gmail.com

Cássia Regina de Toledo Rando

Filiação
Instituto Bauruense de Psicodrama-IBAP
Cargo
Pedagoga, Arteterapeuta, Arte-educadora e Artista Plástica.Coordenadora, e Formadora de Arteterapeutas no Curso de Especialização em Arteterapia
E-mail
cassiarando@gmail.com

Cláudia de Cássia Maganha Vanni Masseran

Filiação
CAPS I de MACATUBA/SP
Cargo
Pedagoga, Psicopedagoga e Arteterapeuta
E-mail
masseranclaudia@gmail.com


Membros:
José Ardonio de Araujo Silva

Filiação
UNESP
Cargo
Mestrando em Mestrando em Comunicação pela Universidade Estadual Paulista pela Universidade Estadual Paulista
Formação acadêmica
Comunicação e Jornalismo

Simone Aparecida Ribeiro

Filiação
CAPS I de Macatuba/SP
Cargo
Assistente Social
Formação acadêmica
Assistência Social

Fábio Luiz Campos Trentin

Filiação
CAPS I de Macatuba/SP
Cargo
Enfermeiro
Formação acadêmica
Enfermagem

Outras Informações


COLEÇÃO

Saúde Digital
Práticas Integrativas e Complementares em Saúde

ÁREA TEMÁTICA

Arteterapia

Situação da experiência

Implementada e em operação regular

DATAS

Início: 2020-03-01

PAÍS

Brasil

ESTADO/REGIÃO

São Paulo

CIDADE

Macatuba

Local

Centro de Atenção PSICOSSOCIAL I - CAPS I de Macatuba/SP

POPULAÇÃO

Idoso
Adulto

IDIOMA

Português

Descritores

Saúde Mental
Arteterapia
Saúde Pública
Intervenção Baseada em Internet
Terapias Complementares
COVID-19

Palavras-chave

CAPS
Covid-19
PICS
Atendimento Online
Oficinas Online